terça-feira, 9 de novembro de 2010

A máquina de fazer espanhóis - Valter Hugo Mãe

A máquina de fazer espanhóis. Sabem o que é?

Comprei este livro sem nunca ler a sinopse, não fazendo por isso a mínima ideia de qual seria o enredo. Habituei-me, de algum tempo a esta parte a relacionar o nome de Valter Hugo Mãe com a nova vaga de escritores portugueses com qualidade.

Será ainda uma promessa?

Lamento não saber responder. A leitura desta obra contribuiu certamente para ajudar a formular uma opinião, mas para responder a esta questão, revela-se insuficiente. Está fácil de ver que esta foi a minha primeira incursão por uma obra do autor, mas por certo não será a última.

Valter Hugo Mãe dedica esta "máquina" a seu pai, o qual não teve oportunidade de viver a terceira idade. É precisamente nesta fase da vida que se encontra o narrador do livro, Sr. António Silva. Curioso este personagem! Após a morte de sua esposa, Laura, é depositado num lar. É aqui que nos conta o que foi e o que é a sua vida. Entre as várias pessoas que conhece, destaco o Esteves, um homem cheio de metafisica, uma personagem que saiu do poema da Tabacaria, de Fernando Pessoa.

Com o senhor Silva conhecemos um ponto de vista sobre a vida nos anos do Salazarismo, mas aprendemos também que nunca é tarde para nos surpreendermos e até para fazer amigos, mesmo que durante toda a vida isso parecesse uma utopia. Curiosa é também a relação que mantém com uma imagem de Nossa Senhora de Fátima, a Mariazinha, conforme gosta de lhe chamar.

Não sou admirador da forma como o autor escreve, mas sou admirador do que escreve. Passo a explicar: Escrever em texto corrido, sem parágrafos, sem discurso directo explicito (se assim lhe posso chamar), é de facto uma forma de escrita que não me atrai. Não quero parecer demasiado conservador, mas sinceramente não percebo o porquê desta moda. Reparei que há um capitulo em que o tipo de escrita nada  tem a ver com o resto. Não percebi o porquê, mas confesso que até gostava! Quando se fala do conteúdo, aí a conversa já é outra. Esta máquina é uma história descontraída, divertida e que dá vontade de ler. Dei por mim algumas vezes a soltar gargalhadas durante a leitura do livro.

Recomendo esta leitura. Para que se perceba melhor esta "boa onda" que o livro transmite, transcrevo aqui um pequeno excerto de texto que me agradou particularmente.

"e  a lei, essa coisa sensível que gosta de nós e se preocupa com o estarmos felizes e confortáveis, comove-me. ... haviam todas as coisas de ser de comer. tudo. carros e casas haviam de ser de comer. e no momento em que estivéssemos para morrer e deixar para impostos e roubalheiras assim, comíamos tudo e depositávamos no testamento o monte de merda que dali resultasse ... que se quisessem vê-lo transformado novamente em casas e carros, teriam de usar para estrumar os campos e depois plantar e regar e tomar conta e depois colher até venderem laranjas das boas como antigamente se fazia no país inteiro."


Sem dúvida, um pensamento bastante curioso!

Págs.287
Ref. ISBN: 978-989-672-016-2
Editora: Alfaguara

10 comentários:

susemad disse...

Li este ano "o remorso de baltazar serapião" por querer conhecer este autor e no final fiquei com a mesma vontade que tu, de voltar a lê-lo.
Entretanto já li uma obra infantil, (desconhecia esta sua vertente) "as mais belas coisas do mundo" e achei-a mesmo maravilhosa.
"a máquuina de fazer espanhóis" aguarda na estante a hora de ser lido. :)

Marco Caetano disse...

Sugiro então que esse seja um dos próximos a sair da estante.
Quando voltar a este autor, gostaria de ler "O nosso reino". Vamos a ver se assim será! :)

cris disse...

Li, gostei muito.
"Gostei.Muito.Como é envelhecer, ver partir um amigo e outro e outro ainda...como perder a vida aos poucos ou como nos tiram, aos poucos, a vida! Gostei. Muito!" in o tempo entre os meus livtos

Tiago M. Franco disse...

Para mim, Valter Hugo Mãe não é uma promessa, a razão é simples, actualmente ele já é uma certeza. A obra é magnífica. Uma grande critica aos "felizes idades" a as pessoas que despacham os seus pais como quem deita fora um garrafa.

Marco Caetano disse...

Olá Cris e Tiago.

Obrigado pela vossa passagem na Conspiração.
Temos de facto bons autores porttugueses que muitas vezes injustamente deixamos de lado, por sei lá que motivos... Felizmente Valter Hugo Mãe já conseguiu arranjar um espaço em muitos de nós. A sua forma de escrita é deveras cativante, e as ideias apresentadas (pelo menos nesta obra demonstram muita originalidade).

Esperemos que nos consiga continuar a surpreender de forma positiva.

Continuação de boas letras...

Paula disse...

Ainda não li nada de Valter Hugo Mãe, mas em 2011 não me escapa!
Gostei do comentário.
Abraço

Marco Caetano disse...

Paula,

Certamente irá gostar!
Fica o convite para que depois aqui venha dizer o que achou!
:)

Grace disse...

Como não tinha lido nada do Valter Hugo Mãe, quando este livro saiu decidi lê-lo e foi uma bela surpresa!
O livro está realmente muito bem escrito e a mensagem é muito forte!
O autor aborda a solidão, o isolamento, o sofrimento, o amor , entre outros, com pinceladas de humor muito interessantes.
recomendo vivamente!

Marco Caetano disse...

Grace,

Concordo plenamente com sua opinião.
Obrigado pelo comentário.

Continuação de boas letras...

camilla disse...

Lemos esta obra no Clube de Leitura Companhia de Papel, em Santa Maria - RS.

Peço licença pra dividir com vc e teus leitores a resenha que fiz lá no meu bloguinho.

Obri!!
abração

http://companhiadepapel.blogspot.com.br/#!/2013/04/a-maquina-de-fazer-espanhois-valter.html