domingo, 10 de fevereiro de 2013

Ensaio sobre a Lucidez - José Saramago

Ensaio sobre a Cegueira, não me canso de dizer, foi uma das melhores obras que já tive o prazer de ler. Não é portanto de estranhar que tivesse bastante vontade de ler  o outro ensaio de José Saramago. Ensaio sobre a Lucidez.

Quando iniciei a sua leitura da obra, não fazia ideia que a acção se passava quatro anos após a cegueira branca que assolou uma nação. Agora, o fenómeno é outro. Na capital deste país é dia de eleições autárquicas. A manhã está chuvosa e a população tende em não comparecer diante das urnas. Tocam alarmes, ninguém percebe o que se passa e tudo indicia elevados índices de abstenção. Porém, ao final do dia, quando está quase a terminar o tempo, milhares de pessoas formam filas enormes para votar. Resultado: quase setenta por cento de votos em branco. Na semana seguinte repete-se o processo. Novas eleições, nova oportunidade de manifestar a intenção de voto. Resultado: quase oitenta por cento de votos em branco.

Mas o que se passou? Porque é que isto aconteceu? Porquê apenas na capital? Terão os políticos perdido a credibilidade? Será isto a democracia? Quem consertou este movimento? 

Os partidos da esquerda, do centro e da direita tentam encontrar um motivo. O governo sabe que caso não o encontre, terá de arranjar uma justificação, custe o que custar. A culpa não pode morrer solteira e o governo da nação é que não pode sair prejudicado.

Polícia, governo e outras autoridades abandonam a cidade e deixam os cidadãos entregues a si próprios. É montado um cerco em todas as entradas/saídas. Ninguém tem permissão para passar até que a verdade seja descoberta.

Através de uma carta enviada para as mais altas patentes da nação, é levantada a hipótese de que o branco dos votos possa estar relacionado com o branco da cegueira anterior. É tempo da entrada em cena de algumas personagens já bem conhecidas do Ensaio sobre a Cegueira.

Subjacente ao romance está uma dura crítica por parte do autor a todo o poder político, ao poder instalado, aos que não vêm meios para atingir os fins. Apesar de não ter sido escrito há muitos anos (o lançamento foi em 2004), a verdade é que é uma trama que continua extremamente actual. Várias vezes dei por mim a pensar o quão bem se enquadra na crise que o país atravessa.

Demorei bastante mais tempo do que seria desejável para ler este livro, ainda assim, nunca perdi a vontade de o ler e gostei bastante. 

Com José Saramago, fica o encontro marcado em data incerta, no Memorial do Convento.

Págs. 332 
Ref. ISBN: 978-972-21-1608-4
Editora: Editorial Caminho